sábado, 23 de março de 2013

Poemas Rupestres – Manoel de Barros


"Por viver muitos anos
dentro do mato
Moda ave
O menino pegou
um olhar de pássaro -
Contraiu visão fontana.
Por forma que ele enxergava
as coisas
Por igual
como os pássaros enxergam.
As coisas todas inominadas.
Água não era ainda a palavra água.
Pedra não era ainda a palavra pedra. E tal.
As palavras eram livres de gramáticas e
Podiam ficar em qualquer posição.
Por forma que o menino podia inaugurar.
Podia dar as pedras costumes de flor.
Podia dar ao canto formato de sol.
E, se quisesse caber em um abelha, era só abrir a palavra abelha
e entrar dentro dela.
Como se fosse infância da língua..."

sexta-feira, 22 de março de 2013

Fabrício Carpinejar

Amor é uma injustiça, minha filha.
Uma monstruosidade.
Você mentirá várias vezes que nunca amará ele de novo e sempre amará, absolutamente porque não tem nenhum controle sobre o amor.

quinta-feira, 21 de março de 2013

O beijo do amado - RUMI

O ladrão de corações
deu-me um único beijo e partiu.
O que seria de mim
se me tivesse dado sete?

Todo lábio que o meu amado beija
guarda sempre a sua marca:
rachaduras abertas na ânsia de sugar
a doçura de seus lábios.

Guarda ainda outra marca:
o desejo louco da água da vida
que a cada instante força o amor
a remover mil fogueiras.

E outra marca mais: o corpo,
assim como o coração, desembestado,
corre de encontro ao beijo
para tornar-se leve e delicado
como os lábios do meu amado.

Ah que suavidade inebriante vem
desse amor que desconhece limites!



Poemas Místicos, Attar Editorial

quarta-feira, 20 de março de 2013

Outono


Hai-Kai de Outono

Uma borboleta amarela?
Ou uma folha seca
Que se desprendeu e não quis pousar?
Mario Quintana


Kant



"Moralidade não é propriamente a doutrina de como nos podemos fazer felizes, mas de como podemos nos tornar dignos da felicidade." 

Immanuel KANT

terça-feira, 19 de março de 2013

S. José

George de La Tour - São José , Museu do Louvre

segunda-feira, 18 de março de 2013

Neruda


Se todos os rios são doces, de onde o mar tira o sal?
Como sabem as estações do ano que devem trocar de camisa?
Por que são tão lentas no inverno e tão agitadas depois?
E como as raízes sabem que devem alçar-se até a luz e saudar o ar com tantas flores e cores?
É sempre a mesma primavera que repete seu papel?
E o outono?... ele chega legalmente ou é uma estação clandestina?

quinta-feira, 14 de março de 2013

Mulheres

 Fernando Botero, bronze, 2006
"... a capacidade de observar - mais do que analisar - está desaparecendo hoje em dia, quando todos querem ser protagonistas. [...] Aqui só se falará de mulheres, de várias delas. Somos todas muito parecidas, muita coisa nos irmana. Seria possível dizer que vou contar uma, duas ou três histórias, mas tanto faz. No fundo, todas temos mais ou menos a mesma história para contar."

Marcela Serrano, Nós que nos amávamos tanto

Jean Auguste Dominique Ingres, La Baigneuse, óleo sobre tela 1808

sábado, 9 de março de 2013

Atitude - Cecília Meireles


Minha esperança perdeu seu nome...
Fechei meu sonho, para chamá-la.
A tristeza transfigurou-me
como o luar que entra numa sala.

O último passo do destino
parará sem forma funesta,
e a noite oscilará como um dourado sino
derramando flores de festa.

Meus olhos estarão sobre espelhos, pensando
nos caminhos que existem dentro das coisas transparentes.

E um campo de estrelas irá brotando
atrás das lembranças ardentes.



Klimt - Hope I - detalhe

sexta-feira, 8 de março de 2013

Dia da Mulher

Fico aqui pensando no ser mulher.
Mulher é mistério, mulher é transformação. Ser mulher é ser mil seres dentro de um só. É ampliar o olhar para além de si mesma: é olhar as necessidades do outro, dos filhos, parceiros, amigos, colegas, funcionários, planeta. É gentilmente colocar-se no lugar do outro e obter uma compreensão maior. E ainda saber voltar o olhar para si mesma na hora certa.
É o dom da maternidade, é estado de graça.
Mulher é visionária, sonhadora. Mulher é poesia. Mulher é cor.
Mulher é decisão, é fazer o que precisa ser feito. É superar dores e traumas, é encontrar forças onde nem imaginava que ainda existiam. Mulher é loba defendendo a cria e seus interesses.
Mulher é esperança. Mulher é romantismo e leveza.
Mulher é complexa, mulher é diferentes texturas e sabores, mulher é aromática.
Mulher é profunda. Mulher é ampla, envolvente. Mulher é fluída.
Mulher é troca, companheirismo, cumplicidade.
Mulher é apoio. É o fio, a trama onde a vida é tecida.
Ser mulher é benção, privilégio e alegria!

quarta-feira, 6 de março de 2013

Neruda - Esperemos


Esperemos

Há outros dias que não têm chegado ainda,
que estão fazendo-se
como o pão ou as cadeiras ou o produto
das farmácias ou das oficinas
- há fábricas de dias que virão -
existem artesãos da alma
que levantam e pesam e preparam
certos dias amargos ou preciosos
que de repente chegam à porta
para premiar-nos
com uma laranja
ou assassinar-nos de imediato.


Pablo Neruda




segunda-feira, 4 de março de 2013

Idries Shah


PERFEIÇÃO ORIGINAL
Era amarelo, macio e roliço; as suas linhas, quebradas, e desajeitados os seus movimentos, cheio de sofreguidão, insegurança e fome.
O seu principal desejo era atingir um estado no qual não precisaria de nada nem necessitaria de fazer movimento algum, apresentando ao mundo uma cara rara – suave, uniforme e delicadamente satisfeita.
Não se deu conta de que era um pintainho que queria ser um ovo.

(Idries Shah, “Reflexiones”…)

sábado, 2 de março de 2013

Neruda - Se cada dia cai




Se cada dia cai

Se cada dia cai, dentro de cada noite,
há um poço
onde a claridade está presa.

há que sentar-se na beira
do poço da sombra
e pescar luz caída
com paciência.

 Pablo Neruda 



sexta-feira, 1 de março de 2013

Baudelaire


«As ilusões», dizia-me o meu amigo, «talvez sejam em tão grande número quanto as relações dos homens entre si ou entre os homens e as coisas. E, quando a ilusão desaparece, ou seja, quando vemos o ser ou o facto tal como existe fora de nós, experimentamos um sentimento bizarro, metade dele complicada pela lástima da fantasia desaparecida, metade pela surpresa agradável diante da novidade, diante do facto real».

Charles Baudelaire, in 'Pequenos Poemas em Prosa'

Se esvaí tão fácil quanto essa delicada flor...